Saturday, October 1, 2016

O sistema que só "funciona" para poucos.


Há mais ou menos 189 países capitalistas no mundo e os exemplos de prosperidade são sempre os mesmos 4 ou 5 paisecos com população pífia, economia pífia e área territorial insignificante. Eu chamo isso de forçação de barra, não sei vocês.

Mas alguém já se perguntou o motivo disso? Bom, para entendermos melhor esse cenário, vamos coloca-lo numa escala menor. Ao invés de falarmos de países, falaremos de pessoas. Sob o capitalismo, existem divisões sociais, essas classes separam os ricos dos pobres. O sistema precisa da garantia de sempre haver pobres, pois é essa a parcela da sociedade que produz e serve a minoria social que acumula riquezas. Não é bom que o números de pobres diminua, pois haverá cada vez menos gente para servir, sem serviçais não há produção, sem produção não há o lucro que gerará riqueza acumulada.

Com os países é a mesma coisa, não é bom que muitos países se desenvolvam economicamente pois isso atrapalharia o fluxo normal dentro do sistema capitalista, pois assim como há trabalhadores serviçais, há "países serviçais". Os países que servem devem continuar servindo ao mercado através de commodities (matéria prima para a fabricação de produtos de alta tecnologia) ou fornecendo produtos de baixo valor agregado, além de mão de obra barata. É importante que o sistema continue somente funcionando para poucos, pois assim a notória distribuição desigual de riquezas do sistema capitalista é perpetuada, e o substancial acúmulo de riquezas se restringe a poucos países. 

Porém é fundamental perceber que a história nos conta que os países economicamente desenvolvidos alcançaram a prosperidade aplicando receitas econômicas muito diferentes das que atualmente recomendam ao países em desenvolvimento. Tais países apontam o caminho errado a ser seguido para chegar ao desenvolvimento. Essas recomendações vem da OMC, do Consenso de Washington e do FMI. Acontece que a Inglaterra, a França, a Alemanha, ou o Japão, ente outros, aplicaram proteção tarifária e subsídios às suas indústrias antes de estarem de fato prontos para o, dito, livre mercado. O detalhe é que desde os anos 80, as recomendações feitas aos países em desenvolvimento são exatamente opostas ao que os países, hoje, ricos fizeram no passado. Sem condição alguma, muitos países do "Terceiro Mundo" aceitam abrir a sua economia, privatizar industrias estatais prosperas, acabar com barreiras e subsídios, etc. Seguem fielmente o que a OMC, o Consenso de Washington e o FMI recomendam; mas o desenvolvimento nunca vem, muito pelo contrário.

Quando o óbvio consequentemente aparece, essas organizações geralmente afirmam que as medidas tomadas não fizeram efeito porque algo como a falta de capacidade, ou falta de vocação, de um determinado país para a economia de mercado (para não citar uma "falta de espírito empreendedor", ou "herança cultural", até mesmo uma "população com baixo QI") foi determinante. Jamais reconhecem o fracasso de suas recomendações, vendidas como "remédios", mas sempre mostrando feito de veneno. É até possível citar uma exceção em meia a tanta canalhice; na edição de junho de 2016 da revista Finance & Development, há um artigo proveniente de um dos maiores defensores do neoliberalismo, o Fundo Monetário Internacional (FMI); artigo esse, de autoria de três economistas da instituição, reconhecendo que o receituário neoliberal, prescrito pelo próprio FMI para nortear o crescimento econômico sustentável em países em desenvolvimento, pode ter efeitos nocivos de longo prazo, dado que, em vez de gerar crescimento, algumas políticas neoliberais aumentaram a desigualdade, colocando em risco uma expansão econômica duradoura, isto é, prejudicando o nível e a sustentabilidade do crescimento. O que, na verdade, só reafirma que as recomendações feitas pelo FMI não devem ser seguidas.

Se a corrente de subserviência não for quebrada pelos “países serviçais”, nada mudará.
Cada país precisa seguir o seu caminho para resolver o seus problemas internos. Para finalmente se desenvolverem economicamente, os países pobres devem recusar o modelo de ajuda econômica internacional, que nunca funcionará satisfatoriamente; depois precisam garantir que as instituições públicas locais sejam desburocratizadas; além de integrar os mais pobres num único sistema econômico formal, gerando registros de propriedade que podem ser convertidos em capital. 


Garantir a existência de um único sistema formal legalizado de propriedade é um passo importante para superar a secular burocracia e ao mesmo tempo melhorar o padrão de vida da maioria social nos países em desenvolvimento. Pois é tirando milhões da informalidade que será possível a geração de capital formal, o que consequentemente movimentará milhões na economia local, aquecendo muitos setores da economia e melhorando o padrão de vida dos mais pobres. É isso o que invariavelmente vemos nos tais 4 ou 5 paisecos com população pífia, economia pífia e área territorial insignificante que sempre são citados por aí como grandes exemplos de sucesso do capitalismo, mas que nunca deram ouvidos ao que a OMC, o Consenso de Washington e o FM tem, ou tiveram, a dizer. Assim, podem fazer parte da minoria para a qual o sistema “funciona”.

Tuesday, March 15, 2016

Uma máquina de zumbis chamada Hollywood


Charge de Pedro Leite

Hollywood é a maior máquina de propaganda que a raça humana já viu, e essa máquina é a grande ferramenta ideológica do imperialismo. Se quiseres ter tua própria opinião e buscar sempre a verdade, então rejeite festivais ou prêmios corporativistas como o Oscar; Hollywood faz mal ao teu intelecto. A arte deveria ser algo puro que mexesse com cada pessoa de uma forma especial, afinal, arte não é (ou não deveria ser) mercadoria. Talvez você já tenha percebido, o maior veículo de propaganda pró-EUA é justamente Hollywood; quase todo o filme, por pior que ele seja, sempre alguma mensagem subliminar aparece em momentos importantes da trama, como alguma bandeira dos EUA visível aos espectadores, ou algum outro óbvio símbolo do país sendo mostrado como a representação do bem que salva a humanidade da tragédia ou de alguma grave ameaça. O imperialismo cultural é uma questão estratégica para os EUA, por isso a política domina a arte em Hollywood.

Os EUA sempre agiram com extrema intolerância para garantir que a sua doutrinação permaneça forte em seu território. A indústria cultural sempre foi um veículo muito utilizado para doutrinar. Todos são induzidos a venerar os valores dos EUA, o “American way of life”, o capitalismo ou o militarismo. Até no processo burocrático para conceder o visto de residente no país, qualquer pessoa que pleteie tal permissão terá que jurar não ser membro de um Partido Comunista, nem ter simpatias anarquista ou defender intelectualmente alguma organização considerada “terrorista”. Se a pessoa responder que sim a qualquer destas perguntas, será automaticamente negado o direito de viver e trabalhar nos EUA por “prova de fraco carácter moral”. Vigiar incessantemente a “moral” do povo ainda é uma tarefa importante para os EUA, desde os tempos do macartismo. O Comitê de Atividades Anti-Americanas do Congresso, liderado pelo senador Joseph McCarthy promoveu uma verdadeira caça às bruxas na busca por pessoas ou obras subversivas. 

Com a ascensão do macartismo nos Estados Unidos, diversos atores e músicos foram perseguidos e acusados de serem comunistas. O ator e diretor britânico Charles Chaplin foi uma das pessoas que sofreram duramente com o macartismo. Por seu posicionamento político, Chaplin foi incluído na Lista Negra de Hollywood. Acusado de propagar a ideologia comunista e criticar o capitalismo em seus filmes, foi expulso dos Estados Unidos e teve seus bens materiais todos confiscados pelo governo. Outras pessoas que sofreram com o macartismo tiveram um fim trágico, muitas se suicidaram e outras ficaram na absoluta miséria. E essa política estérica não se restringiu apenas à industria do entretenimento. No ano de 1950, o físico inglês Klaus Fuchs, membro da equipe dos Estados Unidos que pesquisava a energia atômica, foi duramente perseguido pelo FBI. A perseguição ocorreu quando se descobriu que o físico era membro do partido comunista – o governo norte-americano acusava-o de repassar informações para os soviéticos.

A Lista Negra de Hollywood foi uma lista mantida pela indústria do entretenimento estadunidense com nomes de roteiristas, atores, diretores, músicos e demais artistas para boicotar simpatizantes do Comunismo e negar-lhes emprego. Para entrar na lista bastava defender ideias de esquerda entre conhecidos. Muitos membros da lista foram acusados por colegas, e alguns, comprovadamente sem ligações ao comunismo soviético. A lista arruinou a carreira de muitos profissionais e colaborou para moldar o sentimento anti-comunista no público. O cineasta turco, radicado nos EUA, Elia Kazan ficou conhecido por denunciar grande parte dos que integraram a lista, posteriormente ele recebeu uma medalha do governo estadunidense por serviços prestados ao país. Sobre ele, Orson Welles teria dito: "Kazan trocou a alma por uma piscina".


O filme A Ponte do Rio Kwai foi baseado no romance do francês Pierre Boulle Le pont de la rivière Kwai de 1952. Os autores do roteiro, Carl Foreman e Michael Wilson, estavam na "lista negra" de Hollywood, acusados de pertencer a organizações comunistas, pelo que tiveram de trabalhar secretamente, e sua contribuição não foi credenciada na primeira versão. Por essa razão, o prêmio Oscar ao melhor roteiro adaptado foi concedido unicamente a Pierre Boulle, autor do romance original, que nem sequer falava inglês. O filme Argo narra um fato secundário da Revolução Iraniana a fim de exaltar o papel dos EUA que foram humilhados no processo real. O canastrão Ben Affleck, como diretor, fez um filme de propaganda que distorce os fatos em sua tentativa de apresentar o agente da CIA Tony Mendez como a pessoa que trabalhou nos bastidores para realizar uma fuga. Na época, em uma entrevista para o jornalista Piers Morgan, o ex-presidente Jimmy Carter, afirmou que “90% do plano foi dos canadenses”, mas o filme “dá crédito quase completo à CIA”. Em vez de apresentar um relato honesto de uma missão de resgate, que o embaixador canadense tinha em grande parte planejado e que a CIA só ajudou a executar, Affleck corrompeu a verdade, dando primazia ao envolvimento dos EUA. Ken Taylor afirmou “Tony Mendez ficou um dia e meio no Irã”; Taylor é o ex-embaixador canadense no Irã que realmente arquitetou a fuga dos seis reféns que ele e o primeiro-secretário da embaixada John Sheardown haviam escondido em suas casas. Com “Argo”, um claro exercício de ufanismo estadunidense e imperialismo cultural, Affleck cometeu uma séria fraude. Obviamente não é preciso informar que o filme ganhou um Oscar.


A industria cinematográfica nos EUA, de forma geral, é usada como ferramenta de propaganda que forma ao redor do mundo um verdadeiro exército de zumbis, pois zumbi algum é capaz de raciocinar, de refletir, ou emitir a sua própria opinião. Se isso acontecesse, questionariam o conteúdo propagandista subentendido na maioria dos filmes. Quem não conhece a história pode até achar que os EUA venceram a Guerra do Vietnã, como narra a série Rambo; já no terceiro filme, os Talibãs chegam a ser chamados de "heróis da liberdade" por lutarem contra os soviéticos (vide foto abaixo). Os filmes de western fazem você odiar as vítimas e torcer pelos verdadeiros vilões, pois na vida real não foram os índios que invadiram terras, escravizaram nativos e promoveram genocídios na América do Norte. Hollywood faz mal ao teu intelecto.

Sim, a foto mostra Osama Bin Laden

Saturday, March 5, 2016

O imperialismo nunca escutou a voz de um povo.


Pense um pouco e conte quantas revoluções populares desde o fim do séc. IX não foram abraçadas pela esquerda? Não é a direita que sente a dor de um povo e ouve a sua voz suplicando por mudanças. Kim Il Sung se tornou líder na Coréia, e não apenas no norte, por ser o único líder da resistência antijaponesa que sobreviveu na luta por uma Coreia independente; quem lutou pela formação de uma Coreia unida e livre sempre foram os socialistas, desde os tempo de ocupação japonesa na península.

O imperialismo nunca escutou a voz de um povo, o curso natural da história levaria a uma Coreia socialista e unida, mas os EUA mudaram esse curso, de acordo com as suas conveniências e nada mais. Vejamos que o Japão invade a península coreana e ocupa a região de 1910 a 1945 transformando-a em uma colônia. Esse período foi marcado por muita opressão ao povo nativo, nessa época nasceu o movimento de resistência contra a ocupação japonesa na Coreia que era basicamente formado por socialistas e nacionalistas, entre eles estava Kim Il Sung. Com a derrota na Segunda Guerra e a sua oficial rendição no dia 2 de setembro de 1945, o Japão perdeu todos os seus territórios conquistados. A guerrilha socialista antijaponesa e os movimentos nacionalistas da Coreia criaram Comitês Revolucionários por todo o país, os quais se reuniram em assembleia em Seul e proclamaram a República Popular da Coreia em 6 de setembro de 1945. Dois dias depois, os americanos desembarcaram e ocuparam o sul da Coreia, enquanto dissolviam os Comitês, efetuavam prisões e traziam dos EUA Syngman Rhee para formar um governo apoiado por notáveis pró-japoneses. Rhee rapidamente organizou esquadrões da morte para eliminar ou intimidar os políticos rivais. No norte, manteve-se então a República Popular, liderada pelo jovem comunista Kim Il Sung, e foi implementada uma reforma agrária que consolidou o apoio ao regime. Uma comissão da ONU declarou Syngman Rhee governante do sul, apesar da violência política. Três anos após a divisão da península coreana (sul capitalista e norte socialista) muitas revoltas populares eclodiram no sul, reivindicando a unificação. Os líderes pró-unificação foram assassinados pela polícia do sul. Em 1948, eclodiram revoltas populares nas províncias sulistas de Yosu e Cheju Do, e líderes moderados pró-unificação foram assassinados, ao passo que os soviéticos, se retiravam do norte, como era previsto nos acordos feitos com o ocidente.

Já em 1950, tropas do sul alegaram ter tomado a cidade de Haeju, no oeste, cruzando a fronteira. Tal ação gerou um combate de larga escala por toda a fronteira, mostrando que foi o Sul que começou a guerra. Nos primeiros meses de 1950, Syngman Rhee tinha ordenado massacres e, posteriormente, crimes de guerra contra cidadãos suspeitos de serem comunistas ou simpatizantes; esses episódios ficaram conhecidos como massacres das Ligas Bodo. Documentos oficiais dos EUA relatam testemunhos de oficiais estadunidenses que presenciaram e fotografaram os massacres. Um episódio, após o início do conflito Norte Sul, foi relatado à Washington, pelo general Douglas MacArthur, no entanto não houve nota oficial da Casa Branca sobre o assunto. A reação do lado norte foi tentar acabar de uma vez por todas com os massacres e consequentemente reunificar a Coreia.

É preciso saber que o povo coreano nunca desejou a divisão do país, mas desde a Conferência de Potsdam, após o fim da Segunda Guerra, os Aliados decidiram, unilateralmente, dividir a península coreana. Os EUA não cumpriram com o acertado na Conferência de Moscou, em 1945, que era permitir a formação de um único governo livre para a Coreia. O veterano diplomada estadunidense George F. Kennan, que estava servindo na embaixada de Moscou, observou em loco, com preocupação, a postura do secretário de Estado dos EUA, James Byrnes, e escreveu no seu diário: "As realidades por trás deste acordo, uma vez que dizem respeito apenas aos coreanos, romenos e iranianos, sobre os quais ele não sabe nada, não dizem respeito a ele. Ele quer um acordo para o seu efeito político em casa. Os russos sabem disso. Eles vão ver que para este sucesso superficial ele paga um preço alto nas coisas que são reais ". Os coreanos foram excluídos de todas as negociações; por isso o norte não se conformou com a divisão arbitrária, contra a vontade do próprio povo coreano, e buscou a reunificação da Coréia.

Com a tomada de Haeju, o norte decidiu responder com a Operação Pokpoong, que contou com 200 mil homens. As tropas do norte cruzaram a fronteira no dia 25 de junho; dois dias depois Syngman Rhee ordenou a evacuação da capital Seul. O avanço rápido das forças norte-coreanas para sul deve-se apenas em parte a razões militares. É, em certo sentido, consequência da falta de apoio popular que o regime de Syngman Rhee tinha. Segundo relata o livro "South to the Naktong, North to the Yalu" (1961), de Roy E. Applemanb, o exército sul-coreano “desintegrou-se”, havendo deserções em massa. Em 28 de junho as tropas do norte tomam a capital do sul, onde 48 integrantes do congresso nacional, declararam lealdade aos socialistas. Temendo que mais tarde os chineses e o soviéticos pudessem intervir militarmente em favor do norte, fazendo com que o conflito tomasse maiores proporções, os EUA entram de vez na guerra. Porém, em 27 de junho, os russos haviam enviado um comunicado indireto dizendo que não interfeririam no conflito da Coreia, abrindo assim uma brecha para os EUA intervirem com tropas sob a bandeira da ONU, para não haver reação das demais potências do mundo comunista. Mas em 18 de outubro de 1950 a China envia 300 mil soldados para a Coreia como resposta a "agressão americana sob o disfarce da ONU".

O conflito durou até 1953, como uma queda de braço onde não se aponta o vencedor. Porém, apesar de milhares de mortes, tudo voltou como era antes de 25 de julho de 1950, com um povo divido contra a sua vontade, uma terra arrasada e repartida, exatamente como os imperialistas sempre quiseram. O imperialismo nunca escutou a voz de um povo. O Norte ficou relegado justamente à porção de terra da península menos fértil, pois a maior parte do solo da região é rochoso, impróprio para a agricultura e durante o rigoroso inverno não é possível colher quase nada do que se produz. Enquanto o norte tinha que superar sozinho os seus desafios, o sul tinha uma realidade menos dura contando com a ajuda externa dos EUA. Os capitalistas do sul receberam como forma de "donativo" mais de 3100 milhões de dólares, apenas entre 1945 e 1961. O valor foi o dobro do que foi recebido pelo trio Bélgica/Luxemburgo/Holanda durante o Plano Marshall, mais de um terço do que a França recebeu e mais de 10% do que a Grã-Bretanha obteve; os "donativos" recebidos pelo sul, entre 1945 e 1961, foram superiores ao total dos empréstimos concedidos pelo Banco Mundial ao conjunto dos países em desenvolvimento, que conquistaram a independência. E isso foi só o começo da ajuda ao sul. Mas o quê o ocidente reservou ao norte? Nada além de canções econômicas e calunias midiáticas. Por quê? Porque o imperialismo nunca escutou a voz de um povo.

Sistema e Babilônia


Há milhões de pessoas pelo mundo que são absolutamente críticas aos sistema capitalista, elas não tem lá muito em comum, estão espalhadas ao redor do planeta, mas vêem no seu dia a dia que o referido sistema é prejudicial à humanidade. Há grupos que tem críticas específicas, interpretações próprias, razões de diferentes naturezas. Os Hippies, por exemplo, foram contra o capitalismo em vários aspectos e pela natureza pacifista do seu ideário, eles eram especialmente contra a vertente militarista do sistema. Os Punks sempre tiveram uma postura mais protestante e agressiva, especialmente se compararmos aos Hippies, e assim como todo anarquista, os Punks sempre foram contra a noção de Estado, propriedade e nação. Quase parecido com as intenções anarquistas, a base política dos Punks, o comunismo critica o capitalismo e também almeja um mundo sem fronteiras, sem classes sociais, sem distinção de etnia, gênero, orientação sexual entre os povos do mundo. Há também a religião Rastafari, movimento que conserva elementos do judaísmo e do cristianismo, nascido na Jamaica do século XX. Os adeptos da religião Rastafari reverenciam a figura de Haile Selassie I, imperador da Etiópia, de 1930 a 1974, como a encarnação do Messias e pregam a adoração do deus Jah, sendo portanto, o próprio Selassie o seu deus na terra.

A questão rasta envolve a sua própria fé na crítica aos sistema capitalista. Essa religião afirma que o povo escravizado nas Américas são os verdadeiros filhos de Israel e precisam despertar essa consciência para voltarem à África, onde está o Monte Sião, "Zion", o paraíso na terra. É por isso que os rastas procuram se manter longe da escravidão, ou seja, do sistema capitalista; pois foi isso que vitimou gerações do povo de Jah na opressão de uma terra distante, escravizadas, longe de "Zion". Não apenas por questões religiosas, mas também como forma de defesa, os rastas seguem um modo de vida longe do capitalismo: se vestem à sua maneira, não cortam o cabelo e evitam aparar a barba, seguem uma dieta quase vegetariana (e nada industrializada), preferem tratamento com ervas medicinais e abdicam de qualquer droga. Em muitos países a maconha é ilegal, mas para os rastas a erva é consumida como fonte de iluminação. O consumo segue um ritual: um grupo se reúne, reza em agradecimento a Jah e só então fuma a planta, que é considerada sagrada.

Percebemos uma interpretação religiosa dos males do capitalismo; anarquistas e comunistas não discordam que o sistema capitalista é escravista, mas a visão rasta se embasa na sua fé. Não há como negar toda a história de um povo, é impossível não entender a posição rasta que, naturalmente, condena a ganância, a exploração e o materialismo que resultou em séculos de comércio escravista na África, condenando inocentes à pena perpetua de escravidão longe da sua terra natal. A fé rasta indica que para chegarem ao paraíso,  os rastas devem rejeitar a sociedade capitalista, a qual chamam de "Babilônia", que é vista como impura e corrupta, um reino em rebelião aos ditames de Jah, o criador. Portanto, não importa se você chama de sistema, ou de Babilônia, a referência é feita para o mesmo mal, o capitalismo. "Babylon must fall"!

Tuesday, February 23, 2016

A pegadinha do Sanders


De uma vez por todas, entendam que Bernie Sanders não é socialista, nunca poderia ser, o que o candidato quer é apenas um "capitalismo mais gentil", como isso fosse possível. Não acreditem nessa propaganda barata que estão espalhando pelo mundo. Aqui no Brasil muita gente engoliu esse papo furado. O que Sanders pode ser é apenas a opção menos pior para o alienado eleitor dos EUA, que pode votar no candidato do partido republicano, provavelmente um Donald Trump da vida.

O senador Bernie Sanders é um milionário que buscou ter a imagem de um "outsider" na política estadunidense, onde para ser um candidato com chances de eleição, é preciso ser parte do influente mundo financeiro ou figura já ligada ao governo. E como um "outsider" poderia ser persuasivo numa eleição? Oras, difundido um discurso populista, prometendo mundos e fundos, buscando um público alvo que possa ajuda-lo a se eleger e fazer discursos com tudo o que esse público quer ouvir. Sanders propõe ampliar o controle sobre os bancos e tornar gratuito o acesso à saúde e às universidades públicas. Essas coisas não são tão comuns nos EUA, então soam "socialistas" numa terra onde a maior parte da população resistirá à idéia de eleger um presidente que se defina socialista ou defenda tais idéias. Porém, o próprio senador já fez questão de especificar a sua posição política, ele se colocou como "socialista democrático" contrário ao comunismo. A sua declaração não foi dada sem pensar, pois uma pesquisa do instituto Gallup de junho de 2015 revela que o rótulo de socialista é um grande obstáculo nas eleições. O estudo indicou que só 47% dos entrevistados pelo país votariam num candidato socialista que vencesse as prévias de seu partido, enquanto 50% afirmaram que não o apoiariam. A rejeição a um socialista é superior a um candidato que seja ateu (40% não o apoiariam), muçulmano (38%), evangélico (25%) e gay ou lésbica (24%). Surpresas?

Considerar Sanders um socialista é uma prova de total ignorância, até uma falta de respeito para com os socialistas do mundo. Sanders, na prática, está muito mais alinhado aos valores liberais do que propriamente socialistas. O que ele tem em mente é promover o liberalismo, mas tendo como referências os modelos escandinavos. Talvez ele seja mesmo mais progressista, em tese, do que Hillary Clinton, mas isso não o coloca como o nome a ser apoiado numa eleição na terra do imperialismo moderno.

O partido democrata jamais mudará nada, portanto nunca terá um candidato que almeje mudanças significativas no país. Essa ilusão plantada na mente dos ingênuos gera um alento traiçoeiro, ainda mais com a falsa noção de que um candidato à candidato à presidência dos EUA seja de alguma forma socialista. Ele é simplesmente mais um capitalista estadunidense, nada mais do que isso, o fato de ele ter um pouco mais de consciência social não necessariamente o transforma em um socialista.

Espero que tenham entendido e não caiam nessa pegadinha! É bom lembrar de 2008, quando os democratas voltaram ao poder. As pessoas mundo afora estavam eufóricas com a eleição de Barack Obama, a sua imagem foi planejada para que ele fosse assumido como uma espécie de herói que poderia não só salvar os EUA, mas o mundo. Obviamente, ledo engano, que mais tarde até gerou uma onda mundial de decepção com o seu governo em relação às expectativas ingenuamente criadas. Com Sanders o erro parece se repetir e de forma ainda mais grave; caso ele seja o candidato democrata e se eleja, a decepção será brutal. Mas indubitavelmente menos pior do que um imbecil como Donald Trump na presidência dos EUA.

Saturday, February 13, 2016

Quem é o pai da crise de 1929 (Crash da bolsa de Nova Iorque)?

Documentário A grande crise de 1929, de Joanna Bartholomew:

É relativamente comum algumas pessoas desonestas afirmarem que toda a culpa pela crise de 1929 é da intervenção Estatal. Tal afirmação é um colossal disparate, coisa que na época não se ouvia porque os fatos provando o oposto eram evidentes e muito recentes. Uma ala da direita, tempos depois, buscou revisar a história e distorcer os fatos para que suas idéias não sejam vistas como a causadora da maior crise econômica até hoje. A tradição política em torno da liberdade foi uma constante na história dos EUA, assumindo diferentes significados. Primeiramente, no período colonial, a idéia de liberdade esteve ligada à religião. Progressivamente, tal concepção foi secularizada e logo se passou a conceber a liberdade conectada à obediência das leis. Os colonos, pouco a pouco, adotaram esta concepção de liberdade, que norteou a independência das 13 colônias, processo no qual a liberdade foi evocada como elemento ideológico. Com relação ao âmbito social norte americano, a liberdade se constituiu a partir da garantia do liberalismo político e econômico,  através de um Estado mínimo, pouco interventor e que dava liberdade para o mercado se auto-gerir, sendo esta clara herança do liberalismo clássico. Entretanto, no fim da década de 20, os EUA são afligidos com a Grande Depressão, que abalou as bases do liberalismo em todo mundo e diminuiu o crédito que o liberalismo tinha na época.

Em toda a sua história (especialmente antes de 1929), os EUA sempre foram receptivos aos ideais liberais e nunca se aproximaram dos conceitos socialistas. Isso é verificável em qualquer livro ou material de pesquisa histórica. Percebam que os trapaceiros nunca evidenciam isso, esse é o modus operanti de qualquer argumento desonesto, desde os Terra Planistas, passando pelos criacionistas até os negadores do aquecimento global. Todos descartam a ciência estabelecida, prometendo uma verdade que está somente neles e em alguns poucos lunáticos que os apóiam. Primeiro afirmam que os livros didáticos e, por subsequência, a academia de história é dominada pelo pensamento marxista, o que é uma desonestidade brutal, a academia de história é dominada pelo pensamento da Escola dos Analles; o trapaceiro precisa mentir e omitir para impor seu raso argumento.

Após à Primeira Guerra Mundial, os países europeus se tornam devedores dos EUA, isso fez com que a indústria de lá tivesse menos concorrentes fortes pelo mundo. A guerra trouxe muitos benefícios econômicos aos EUA. A produção de bens aumentou de maneira vertiginosa e a década de 20 foi marcada por um clima de euforia próprio do American Way of Life. Muitos americanos foram atraídos pelo rendimento a curto prazo, ações monetárias. Atribuir a crise de 29 a uma suposta intervenção estatal é uma das maiores idiotices que ainda se ouve por aí. O sistema capitalista busca sempre o lucro, e as metas são sempre maiores lucros; para que a meta seja alcançada, normalmente, a produção é sempre aumentada para o volume de vendas seja maior, o que geraria um aumento dos lucros. Acontece que toda empresa de um determinado segmento pensa assim, querem mais lucros e produzem mais; a questão é que em um mercado aquecido e competitivo, o resultado de tal ambição é a saturação do mercado, pois não há capacidade infinita de consumo, não importa o mercado (mesmo havendo exportação). Mais cedo ou mais tarde tal segmento entrará em crise porque produziram mais do que serão capazes de vender, o resultado disso não é um lucro maior, e sim um tremendo prejuízo. Durante a Primeira Guerra Mundial, a economia estadunidense estava em pleno desenvolvimento. As indústrias de lá produziam e exportavam em grandes quantidades, principalmente, para os países europeus. Acontece que após a guerra, o quadro não mudou, pois os países europeus estavam voltados para a reconstrução das indústrias e cidades, necessitando manter suas importações, principalmente dos EUA. Esse período era crucial para que a indústria dos EUA pensassem que a Europa poderia diminuir o seu volume de importação após alguns anos, mas a ambição impediu tal reflexão; então a situação começou a mudar mesmo lá no final da década de 1920. Reconstruídas, as nações européias diminuíram drasticamente a importação de produtos industrializados e agrícolas dos Estados Unidos, até para que suas dívidas não crescessem ainda mais.

Com a diminuição das exportações para a Europa, as indústrias norte-americanas começaram a aumentar os estoques de produtos, pois já não conseguiam mais vender como antes. Grande parte destas empresas possuíam ações na Bolsa de Valores de Nova York e milhões de norte-americanos tinham investimentos nestas ações. Os lunáticos que buscam distorcer a historia costumam blefar ao afirmar que o estimulo dos grandes bancos em prover crédito para que os cidadãos comuns investissem sem critério na bolsa foi o início de tudo para a crise. Não citam que durante a década de 20 os EUA estavam passando por um boom econômico e com uma tradicional filosofia de governo que deixava claro a não interferência no mercado, tanto é que muitos não dizem nada sobre o presidente Herbert Hoover, que não fez nada para amenizar os efeitos da depressão por acreditar que o mercado se auto-regularia. Enquanto isso, 2000 mil bancos decretaram falência, a industria norte-americana perdeu 22% do seu valor. Em outubro de 1929, percebendo a desvalorizando das ações de muitas empresas estadunidenses, houve uma correria de investidores que pretendiam vender suas ações. O efeito foi devastador, pois as ações se desvalorizaram fortemente em poucos dias. Pessoas muito ricas, passaram, da noite para o dia, para a classe pobre. O número de falências de empresas foi enorme e o desemprego atingiu quase 30% dos trabalhadores. A primeira prerrogativa de qualquer trapeceiro que buscar distorcer a história é descartar a ciência estabelecida e apontar que a verdade está nele e em seu reduzido grupo de "pensadores". Eles se esforçam de verdade em convencer mais e mais ingénuos por aí; infelizmente, muitos até lhes dão ouvidos e ignoram os fatos. A crise interna, também conhecida como “A Grande Depressão”, foi a maior de toda a história dos Estados Unidos. Como nesta época, diversos países do mundo mantinham relações comerciais com os EUA, a crise acabou se espalhando por quase todos os continentes. 

Se dá crédito (pedido pelos empresários), a culpa é do Estado, se não dá crédito, a culpa é do Estado. O crédito foi dado, e quem fez uso do crédito mesmo? Alguém foi obrigado a usar o crédito? A polícia pôs armas na cabeça das pessoas para que usassem os créditos? A especulação e uso do crédito foram privados! Não importa a saída encontrada, a ônus sempre será dado ao Estado, é assim que os desonestos definem a história. É preciso apenas entender que crise de 1929 foi de superprodução e que atingiu todos os países capitalistas, uma vez que a integração econômica mundial permitiu isso. A capacidade de consumo dos países que mantinham relações econômicas com os EUA não foi capaz de acompanhar o ritmo da produção. A crise não foi nenhuma surpresa, uma vez que toda a prosperidade dos anos 20 não poderia ser mantida, justamente por ser artificial. A superprodução industrial motivou a desequilíbrio econômico, mas foi a especulação o verdadeiro golpe de misericórdia que tornou tal crise a maior até hoje. O sistema especulativo, que com seus lucros gerados pelas empresas de base dos holdings – que eram poucas e que, praticamente, sustentavam a economia –, não investia em atividades produtivas, mas, sim, em mais especulação, era um dentre vários pontos de incoerência na economia estadunidense (sem falar na clássica desigual distribuição de renda). 

 Mais tarde, quando houve a quebra nos EUA, a Europa quebra junto, já que o primeiro era o maior credor mundial. Para sair do apuro, as medidas da maioria dos países europeus foram se voltar para reconstrução de seus mercados internos, lançando mão de medidas protecionistas. Isso inspirou a intervenção Estatal tardia nos EUA através do New Deal (já com Franklin Delano Roosevelt na presidência), que se voltou predominantemente para a restruturação do mercado interno.


* Fonte:
ALONSO, Juan José. Herbert C. Hoover y Franklin D. Roosevelt: Depresión y New Deal. In: Los Estados Unidos de América: Historia y Cultura. Salamanca: Almar, 2002.

BOSCH, Aurora. Historia de Estados Unidos (1776-1945). Barcelona: Crítica. 2010.

CROUZET, Maurice. A Grande Depressão. In: História Geral das Civilizações. VII – A Época Contemporânea. São Paulo, Difel, 1977, p.p. 128-130. Apud. MARQUES, Adhemar et al. História Contemporânea Através de Textos. 10 ed. São Paulo: Contexto, 2004.p.p.159-160.

FONER, Eric. La Historia de la libertad en EE.UU. Barcelona: Ediciones Península, 2010.

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MARQUES, Adhemar et al. História Contemporânea Através de Textos. 10 ed. São Paulo: Contexto, 2004.

Friday, February 12, 2016

A meritocracia é uma ilusão e a mobilidade social é um mito


A meritocracia é uma ilusão alimentada por exceções tão raras que diante da realidade evidente, se tornam até desprezíveis. A tal meritocracia deveria se basear em algum mérito para que o seu conceito faça algum sentido. A questão é que o tal mérito é sempre indefinível e passa longe de questões morais, muito menos das questões éticas. O discurso em si apenas tenta eliminar qualquer empatia para validar a idéia de que a miséria alheia é uma conseqüência justa, o que pode, na cabeça de certas pessoas, eliminar um provável peso na consciência de quem faz parte de uma sociedade desigual. Durante o século XX milhões e milhões de pessoas nasceram na pobreza, trabalharam muito a vida inteira e morreram pobres. A ilusão da meritocracia, que supostamente promove a justiça para quem tem mais mérito, apenas costuma ser visível para os mais abastados. Associada a isso, vemos um outro mito, o da mobilidade social. A ilusão da meritocracia e o mito da mobilidade social caminham juntos e são freqüentemente citados, até simultaneamente, mas sempre estão agarrados aos raros casos específicos onde uma excessão ilustra tais mitos e ilusões, mas jamais valida propriamente tal discurso. 

Normalmente, pesquisas sobre mobilidade econômica intergeracional ignora o contexto geográfico da infância, incluindo a qualidade da vizinhança e o poder de compra dos habitantes de um determinado bairro. Supõe-se que a variação individual na mobilidade intergeracional é em parte atribuível às condições regionais e de bairro, mais notavelmente o acesso às escolas de alta qualidade. Percebe-se que a renda média do bairro tem quase metade do efeito sobre as futuras rendas do que a renda dos pais de um morador. Estima-se, nos EUA, que a renda familiar de toda a vida seja de R $ 635.000 dólares maior se as pessoas nascidas em um bairro pobre tivessem sido criadas em um bairro de classe média alta. Quando as rendas são ajustadas ao poder de compra regional, estes efeitos tornam-se ainda maiores.

Simplesmente nascer em um bairro pobre impossibilita qualquer chance de haver mobilidade social a uma pessoa, e isso se aplica por décadas. Uma das razões para isso, é que sob o ponto de vista econômico, poucas coisas importam tanto para o nosso destino como o bairro em que nascemos e crescemos, acredite se quiser. A relevância disso está na redução de possibilidades materiais de seus habitantes. "Nos Estados Unidos gostamos de pensar que qualquer pessoa pode ir para onde quiser com base apenas em seus talentos e habilidades. Mas isso é cada vez menos o que acontece. O talento e a habilidade se contraem quando as pessoas estão presas em ambientes segregados." afirmou Douglas Massey, pesquisador da Universidade de Princeton. O que, atualmente, podemos considerar como ambientes segregados? Os guetos das grandes cidade do mundo.

De acordo com um estudo publicado em 2014 pelos pesquisadores Douglas Massey, da Universidade de Princeton, e Jonathan Rothwell, do Instituto Brookings, o simples fato de se mudar de um bairro precário para um melhor, não é suficiente para mudanças significativas. A pesquisa aponta que o local específico da cidade onde uma pessoa passa os primeiros 16 anos de sua vida é determinante na renda que ela terá muitas décadas depois, mesmo que mude seu local de residência diversas vezes. Deixando de lado a relativização, o conteúdo do estudo mostra que a possibilidade de ascensão e mobilidade social é ínfima e desde muito cedo definida na vida de cada pessoa. A segregação social é evidente sob o capitalismo, e diante de tal estudo é impossível não haver o debate sobre equidade, pois uma discussão sobre propostas até polêmicas de vários países, incluindo alguns latino-americanos, de levar habitantes de bairros pobres para viver em regiões mais ricas das cidades, é mais racional do que se apegar ao mito da mobilidade social ou da meritocracia. À medida em que a distribuição de renda fica mais desigual, ocorre o mesmo com a distribuição dos bairros. A concentração da riqueza e da pobreza aumenta. Os bairros pobres se tornaram mais pobres e fica mais difícil escapar do status socioeconômico da pobreza.

Quem mora nos guetos do mundo sabe que as experiências vividas no local de nascimento também são uma herança da qual é difícil escapar, pois o bairro é o ponto crítico onde se bloqueiam as aspirações das pessoas para subir na vida. Toda cidade tem duas realidades bem distintas e a perspectiva de vida de uma pessoa que vive em uma determinada realidade é totalmente diferente de quem vive em outra. Isso não é difícil de se observar, já que os bairros pobres, em qualquer lugar do planeta, tendem a ter taxas mais altas de desordem social, crime e violência. As pesquisas mostram cada vez mais que a exposição a este tipo de violência não tem somente efeitos de curto prazo, mas também de longo prazo na saúde e na capacidade cognitiva de seus moradores. Tais aspectos são permanentes e não se apagarão das pessoas, mesmo quando crescerem. A vida nos bairros mais carentes implica frequentar escolas de má qualidade, ficar mais longe das oportunidades de trabalho e mais perto dos focos de violência de nossas cidades. Garantir aos jovens de classes sociais mais baixas a oportunidade de começar suas vidas em regiões mais ricas pode ter um grande impacto positivo em suas trajetórias de vida.

Acabar com a segregação social é um passo importante para que o simples fato de nascer em determinado bairro não se transforme em uma sentença. Após a Segunda Guerra, Londres construiu moradias subsidiadas em bairros ricos, o governo ajudou as pessoas a se mudar de regiões de muita pobreza para áreas de classe média e alta, onde poderiam ter fácil acesso às vantagens que as comunidades mais abastadas oferecem. Viu-se que findar a segregação por bairros, a mesma que faz com que a vida de cidadãos de diferentes classes econômicas acabem tomando direções opostas em suas vidas, é quebrar o ciclo social estabelecido.

Recentemente, a proposta do prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, de um programa piloto para levar habitantes pobres para viver em um conjunto de edifícios de um bairro rico causou polêmica na Colômbia. Perceba que as pessoas que defendem a ilusão da meritocracia e acreditam no mito da mobilidade social são exatamente as mesmas que se opõe veementemente aos projetos de mobilidade real. A Colômbia não foge a essa regra pois em Bogotá a proposta de Petro foi chamada por opositores de medida populista e classificada como uso pouco eficiente de recursos públicos escassos. Eles afirmam que estes recursos deveriam ser usados para melhorar as condições dos bairros pobres onde vive a maioria dos habitantes da capital colombiana. A ilusória meritocracia é sempre utilizada para criticar as medidas sociais usando a justificativa de que todos têm as mesmas oportunidades e que o mérito verdadeiro – o sucesso profissional, por exemplo – depende única e exclusivamente do esforço individual. Sabemos muito bem que a realidade não é tão simples quanto essa ilusão possa parecer.